É madrugada, é tarde para
tudo...
Caminhando pela calçada antiga,
pedras desenhadas, conhecidas,
mar silencioso, avenida de
orla,
deserta.
Um banco tosco propõe descansar,
passar o tempo que já não
apressa
este espectador em
semi-presença.
Som distante, crescendo,
passos ritmados,
ameaçando meu silêncio.
Um vulto se aproximando,
alternando nítido e difuso,
sob a iluminação melancólica.
Jovem compenetrado,
andar acelerado,
rumo teleguiado.
Reconheço as feições, atitude
altiva,
olhar determinado, aura
transpirando
ideais, esperanças, planos,
projetos,
angústias.
Ensaio um tímido gesto,
convite mudo à conversa.
Seu olhar polidamente recusa,
como tantas vezes recusei
às visões,
em minhas madrugadas.
Vulto se distanciando,
alternando nítido e difuso,
sob a iluminação melancólica.
Ah, tanto lhe queria contar
do que sei e jamais aprendi,
das mil precauções a tomar,
de tudo o que todos querem,
dos caminhos e
encruzilhadas,
de todas as portas abertas
às formas espertas de ser,
dos valores e conceitos
inúteis,
das fúteis palavras soltas,
das mensagens que não
chegarão,
das paredes de vidro do
coração,
do cárcere das memórias,
passado a escrever
histórias.
Silêncio envolvendo meus
pensamentos.
Nada a ensinar a quem a
essência jamais permitiu
crer sem compreender, desistir
para não tentar,
querer sem perseverar, dizer
sem acreditar,
transigir, esquecer,
perdoar.
Reconhecido nesse passado,
não me reconheceu neste presente.
Aguardar o amanhecer,
única forma de reiniciar,
pois é madrugada, é tarde para
tudo.
17-19.12.2012