Resfriado forte.
Meio de madrugada de sexta-feira, acordo
morto de sede.
Levanto-me da cama, dirijo-me à cozinha.
O Rivotril parece haver transformado o
corredor em um Duto de Agility.
Infelizmente, as paredes não são macias, não
sou um Border Collie, e não existe treinador indicando o caminho.
Bebo dois copos de água, mas a sede
persiste.
Deixo à mão um copo de Coca-Cola gelada,
para beber dentro de alguns minutos.
Pego um blister contendo 6 "comprimidos
antigripais".
Aparência de novo, mas não enxergo a data de
expiração.
Passo novamente pelo Duto de Agility.
Memorizei as curvas que não estão lá (mas
parecem estar).
Volto com os óculos para leitura.
Nenhuma data de validade.
!#*&%*!!!
Vamos em frente...
Pelos três princípios ativos estampados no blister,
considero que suas dosagens não deveriam ser expressas em miligramas, mas em
megatons.
Por precaução, decido iniciar com ½
comprimido.
Posiciono cuidadosamente o dito cujo num fracionador
recém adquirido na Drogasil.
Um apertão moderado e... nada.
Aperto firmemente.
O treco de acrílico se fecha com um estalo, parece
ter sido destruído.
Procuro por um comprimido cortado precisamente
ao meio, mas o vejo esfacelado, no receptáculo do fracionador.
Aparelhinho idiota!
Deveria ter continuado a partir comprimidos
com as mãos, como sempre fiz.
Observo os fragmentos minúsculos.
Talvez isto seja um "sinal" de que
deva fazer um teste com apenas ¼ de drágea.
Escolho um fragmento que me parece corresponder
a ¼, mas não consigo pegá-lo, porque meus dedos não cabem no receptáculo.
Tento, sem sucesso, usar uma colher de café
para capturar aquele pedacinho milimetricamente escolhido.
A paciência se foi...
Despejo tudo em uma colher de sopa e noto
que, além dos fragmentos, boa quantidade do medicamento foi reduzida a pó.
Irritado...
Desisto do teste e coloco na boca todo o
conteúdo da colher de sopa.
Dane-se!
Percebo imediatamente que aquilo é amargo,
muito amargo!
O que mais usaram na fórmula? Quinino?
Cicuta?
Preciso urgentemente de algum líquido.
Meu providencial copo de Coca-Cola está bem
à mão.
Um pequeno gole...
Forma-se uma espumarada fervilhante em minha
boca.
Muito irritado...
Teimosamente, engulo o veneno espumante,
porque essa m... de comprimido é meu!
O sabor amargo não se dissipa.
Bebo o restante da Coca-cola.
Meu estômago parece haver-se transformado
num reator colapsando, rumo à Síndrome da China.
Não consigo deixar de grunhir uns palavrões.
Tuco, um dos nossos cães, me olha com ar
espantado e se recolhe, talvez suspeitando que minha vacinação não esteja em
dia.
Odeio resfriados.
Odeio "antigripais".
Odeio fracionadores de comprimidos.
Odeio misturas que espumam.
Agora, preciso de um antiácido.
Felizmente, Mylanta é líquido.
01-março-2014
©Alfredo Cyrino / Indigo Virgo®